O luto e as suas fases muito bem desenhadas em WandaVision

wandacrying
Por Caroline Benigno Cardoso | 6 de mar. de 2021 | Reflicções - reflexão da ficção | Séries | comentário(s)

Imagino que você já esteja com saudades de WandaVision tanto quanto eu. E que série incrível foi essa! Começou com a leveza do sitcom e terminou com o peso da dor e luto. E que momento das nossas vidas para trazer esse tema, não é mesmo?

A séria toda trata dos processos do luto de forma magistral. Para falar mais sobre o assunto, menciono Elisabeth Kubler-Ross, psiquiatra que é referência neste tema, autora de “Sobre a morte e o morrer” publicado em 1969, a partir da observação e prática que tinha com pacientes com doenças terminais.

O luto é uma emoção não patológica vivenciada a partir de uma perda significativa, geralmente vinculado ao falecimento. O processo é vivenciado de forma muito pessoal e pode ter diferentes expressões de acordo com a cultura. No caso de luto por falecimento, acontece um intenso sofrimento acompanhado de tristeza, choro, memórias da pessoa perdida, arrependimentos em relação ao que poderia ter sido diferente na relação, ansiedade, inquietação, hostilidade, podendo ocorrer também emoções aparentemente conflituosas, como raiva e alívio. Com o passar do tempo, a tendência é que a tristeza associada à perda seja menos sentida.

Há um consenso de que o luto pode se tornar patológico quando passa de 6 meses e continua causando intenso sofrimento. O luto patológico pode ser motivado por situações específicas de morte, como perda inesperada de alguém jovem, morte por situação de violência, suicídio, dentre outros agravantes.

No luto, temos 5 fases previstas pela autora acima mencionada:

  • Negação: Período que acontece geralmente após o recebimento da notícia de perda. A pessoa pode permanecer em estado de choque e desconexão, como forma de se defender da intensa carga emocional.
  • Raiva: A pessoa aceita parcialmente a perda, mas permanece inconformada, ressentida e com inveja de outros que contiuam vivos. Pode sentir que a morte foi injusta e que não deveria ter acontecido, se rebelando contra fatores externos que muitas vezes não tem participação.
  • Barganha ou negociação: Mais comum no caso de pacientes terminais. A pessoa procura negociar uma vida extra, encontrar tratamentos alternativos ou negociar com Deus, para reverter o acontecimento.
  • Depressão: Inclui maior aceitação sobre a perda e sentimentos de tristeza e solidão. É um momento mais introspectivo em que se tende a pensar na falta que o outro fará em sua vida e na das pessoas próximas.
  • Aceitação: É o momento em que a dor se torna menos intensa e a pessoa consegue se reorganizar. As lembranças boas são mais presentes e a pessoa enlutada volta a ter esperança no futuro.

É importante dizer que nem todas as pessoas passam por todas as fases, e também não necessariamente o luto é vivido nessa ordem. Na vida real podem acontecer retornos a fases anteriores, ou nuances de cada período um pouco misturados.

Voltando para WandaVision, é fácil observar todas as fases do luto acontecendo.

Os primeiros episódios são de pura negação. Wanda não tem ideia do que está fazendo e passa por um sitcom super divertido e leve. A partir do episódio 3 e 4, vemos mais sinais da fase de raiva, quando Wanda luta para que sua ilusão não desmorone.

Nos episódios 5, 6 e 7, Wanda ainda não tem plena noção dos prejuízos que está causando aos moradores de Westville. Assim, há uma certa negação, mas também raiva e barganha, quando tenta convencer Hayward de deixá-la em paz e quando continua lutando para manter o Hex intacto.

O episódio 8 (meu preferido) é aquele em que conseguimos nos conectar com toda a dor de Wanda. O retorno às cenas de grande carga emocional da sua história faz com que a gente compreenda de forma empática tudo o que ela é e faz. É um episódio de depressão, em que conseguimos notar todo o seu sofrimento.

O episódio 9, também maravilhoso, mostra alguns momentos distintos. Primeiro, Wanda precisa lutar contra Agatha para manter ainda a realidade que vive e os familiares que ama. Depois toma o choque de realidade, ao perceber que estava torturando pessoas de forma inconsciente. Nesse momento, ela percebe que deverá fazer uma difícil escolha. É neste ponto em que acontece a aceitação do luto, que segue para as cenas de despedida que pudemos compartilhar. (chorando litros)

Interessante é notar que a série mostra uma intersecção com as nossas vidas atuais, especialmente para nós brasileiros. Mesmo que não tenha sido intencionalmente planejada para um período de pandemia, o luto de Wanda se conecta com o luto de milhares de famílias no mundo.

Imagino que cada pessoa que tenha perdido um ente querido por COVID -19, se tivesse o poder de criar um pequeno mundo protegido, o teria feito.